Parceria anunciada em meio à estreia do canal passou despercebida, e reforça aposta da emissora em tempo real e conteúdo modular para vencer a disputa pela atenção no esporte, seguindo o manual que deu certo com a TNT Sports Brasil
Transcorridos cinco dias desde a estreia da GE TV, parece haver um consenso nas conversas sociais de que o canal digital da Globo é mais próximo do antigo Esporte Interativo do que uma cópia fiel da CazéTV.
Entre as repercussões das primeiras transmissões — Eliminatórias e NFL — um detalhe, porém, foi pouco aprofundado: o anúncio oficial da parceria com o TikTok. O movimento confirma o que escrevi semanas atrás: com a saturação de plataformas, a descoberta se tornou o fator decisivo.
Na prática, a Globo usará o perfil da GE TV no TikTok para transmitir alguns jogos, além de bastidores, conversas e melhores momentos em tempo real. É um modelo que reforça a estratégia multiplataforma anunciada no lançamento, mas também reposiciona a Globo em um espaço onde a TV aberta já não dita sozinha o ritmo da audiência.
Manzar Feres, diretora de negócios da Globo, falou em “inovação de formatos e distribuição digital”. Eduardo Lorenzi, diretor de operações do TikTok na América Latina, reforçou: unir informação, entretenimento e linguagem nativa da comunidade.
O ponto central é entender o que está em disputa. Como observou Ian Whittaker, se o YouTube já é percebido como “TV”, por que o TikTok não reivindica o mesmo status? O analista banca que a plataforma “não precisa.”
Dados compartilhados por Whittaker mostram que o TikTok reivindica a liderança na guerra dos criadores e está em rota de ultrapassar o YouTube em crescimento publicitário global: aumento de 63% em 2024, chegando a US$ 39 bilhões fora da China.
Para Whittaker, o embate desenrola-se por meio de estratégias distintas: o YouTube busca capturar dólares de TV para manter sua curva de crescimento, enquanto o TikTok foca na economia de conteúdo modular: um ecossistema impulsionado por criadores e distribuído em múltiplos formatos e plataformas.
Harry Metzger complementa essa leitura ao destacar que tanto TikTok quanto Meta trabalham em aplicativos de TV, mirando públicos mais velhos sem perder a centralidade no social. A lógica é menos sobre substituir a TV linear e mais sobre expandir a superfície de consumo. Nesse cenário, não há contradição em o TikTok ser o motor do conteúdo curto no celular e, ao mesmo tempo, buscar relevância na sala de estar.
O case TNT Sports Brasil & TikTok publicado pela Forbes Internacional no mês passado ajuda a entender o que está em jogo.
Apesar de ter uma das maiores bases de seguidores, a TNT não convertia esse alcance em visualizações. A virada veio quando adotou um manual pragmático: frequência alta, SEO como pilar de descoberta, posts em tempo real, experimentação criativa, uso de personalidades no conteúdo e ferramentas nativas como vídeos fixados. O resultado foi transformar volume em impacto e os clipes virais em pontos de entrada contínuos.
Esse é o manual que interessa à GE TV. Com uma semana de debute, o perfil do canal no TikTok já tem 146 vídeos postados que acumulam 1,4, milhão de curtidas.
A Globo compreendeu que a estratégia atual exige atuação em tempo real e uso de clipes como impulsionadores de publicidade. O desafio operacional é converter transmissões lineares em conteúdo social consistente. Nesse contexto, o controle do processo de descoberta é crucial para consolidar ecossistemas multiplataforma.
Como já escrevi, a próxima fronteira não é ter o conteúdo, mas garantir que ele seja encontrado e valha o tempo do espectador.
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