O marketing político vive um momento de encruzilhada. A era da comunicação digital fragmentou os canais, acelerou os fluxos e, ao mesmo tempo, superficializou as mensagens. A busca pela “partícula TikTok” — uma unidade mínima de conteúdo capaz de capturar atenção e ainda transmitir sentido político relevante — tornou-se o novo Santo Graal das campanhas eleitorais.
Em recente palestra, o mestre João Santana, publicitário celebrado internacionalmente e citado pelo The New York Times como influência na contenção do domínio norte-americano sobre América Latina e África, abordou essas encruzilhadas e apontou com precisão os dilemas da atualidade. Tive a honra de trabalhar ao seu lado por cerca de cinco anos e testemunhar de perto sua obsessão por conteúdo, forma e impacto. Para João, o marketing político precisa se reinventar, reencontrando o equilíbrio entre estética e substância, entre simbolismo e propósito. A política não pode se tornar refém do “cata-clicks”, das dancinhas vazias ou dos conteúdos que privilegiam curtidas ao invés de ideias.
Vagner Araújo
O que se vê, infelizmente, é a banalização da comunicação eleitoral. O discurso político tem se derretido em meio a uma avalanche de vídeos curtos, memes e truques de algoritmo. A substância, que deveria oferecer ao cidadão uma base de avaliação racional e emocional de propostas, ideias e compromissos, cede lugar à estética rasa da performance digital. Isso afeta a qualidade da democracia, pois esvazia o momento do voto de conteúdo real.
A dificuldade não reside apenas na técnica de comunicação, mas no entendimento das emoções humanas. Simpatia, espontaneidade e estética têm se sobreposto a valores como caráter, visão, experiência e espírito público. Assim, elegemos líderes pela imagem projetada em poucos segundos, como se estivéssemos escolhendo um influenciador e não um gestor público.
Enquanto a política não reencontrar sua linguagem, os sintomas permanecerão: campanhas despolitizadas, ausência de debates e perpetuação das dores sociais — da saúde ao emprego — sem soluções minimamente debatidas.
Imagine escolher um piloto de avião para conduzir 300 passageiros com base apenas em carisma. Ou um cirurgião vascular, sem atentar ao seu histórico profissional, apenas pela aparência. É o que temos feito na política. A liberdade de escolha é sagrada, mas precisa estar ancorada na informação qualificada — o que se torna cada vez mais raro nos canais em que hoje se travam as batalhas eleitorais.
A partícula TikTok precisa ser encontrada — ou reinventada. Não para entreter. Mas para informar, sensibilizar e mobilizar. O futuro da democracia depende disso.